Por Milene Andrade – Educadora do Grupo AdoleScER
Ao longo dos anos em que estabeleceu parceria com a escola José Maria, no bairro de Santo Amaro (Recife), através do projeto com foco na redução da violência escolar e comunitária e da participação ativa de adolescentes e jovens, o Grupo AdoleScER tem aprofundado a discussão de que uma escola melhor se faz a partir da inclusão de todos os agentes que a compõe (estudantes, familiares, professores, funcionários em geral e gestão) e da construção coletiva, escutando a juventude, estabelecendo diálogos frequentes para o processo de transformação do espaço educacional: que disponha de metodologias inovadoras, fortaleça o corpo docente, gere proatividade dos discentes e estabeleça vínculos comunitários.
Na escola em questão, o GA iniciou um diálogo forte com a gestão, professores e funcionários, de modo a identificar quais os problemas mais gritantes com os quais eles lidavam diariamente, apesar de já ser possível identificar alguns nas “visitas de aproximação”[1] que são realizadas semanalmente pela equipe do projeto ao espaço e, na sua maioria, os problemas relacionados estavam ligados aos estudantes: comportamento, brigas, falta de respeito com professores e funcionários., Além de muitos relatos sobre a ausência familiar nas reuniões e no acompanhamento diário dos jovens na escola.
A equipe do Grupo AdoleScER buscou escutar também os estudantes, entender que tipo de escola eles queriam e o que não os agradava no espaço escolar em que frequentam todos os dias. Esse processo não se dava apenas com o intuito de problematizar essas questões, mas passava também por um estímulo constante na perspectiva de compreender como cada um deles poderia contribuir para a construção de uma escola ideal. Como essa transformação poderia ser iniciada pelos estudantes.
Dessa forma, iniciamos os trabalhos com os Jovens Protagonistas (representantes de turma), onde, em cada sala, foram eleitos um estudante titular e outro suplente e, após o horário escolar, semanalmente são desenvolvidos encontros de diálogo, construção e ação. Tudo feito de forma participativa, onde as principais ideias partiam dos adolescentes e a orientação ficava por parte da equipe do projeto.
A cada encontro é refletido com os/as jovens a responsabilidade assumida por eles e elas em ser protagonista no espaço escolar, de serem personagens centrais no processo de transformação e que esta transformação deve acontecer de dentro para fora, possibilitando ajudar outros alunos e todo o espaço como um todo. Não significa que estes estudantes são vistos como destaque, mas atores principais na busca por um papel ativo e colaborativo na família, escola e comunidade (este tripé é fundamental quando se busca uma escola mais participativa que mude as estruturas de problemas que nela existe).
Nas reuniões são estimuladas questões básicas para uma boa convivência: como pedir desculpas, por favor, obrigada. Se propõe o diálogo entre eles e demais integrantes da comunidade escolar, além de incentivá-los a fomentar essas mesmas questões nas suas turmas. E mais do que tudo, eles são ouvidos e se sentem parte.
Outra etapa deste processo é que para cada problema identificado pelos jovens, no ambiente escolar, são levantadas também propostas de intervenção e, dessa forma, muita coisa vem sendo construída e desenvolvida por eles: Show de talentos, melhoria dos espaços de convivência, Grafitagem, melhoria da estrutura das salas de aula, valorização da merenda, ações sobre respeito e redução da violência, comunicação direta com gestores e professores para levar as reinvindicações das turmas. E é dessa forma que é importante perceber a escola, que começa a criar o seu próprio movimento orgânico de mudança em algumas estruturas que eram identificadas como problemas centrais.
De fato, ainda há muito para mudar, inclusive inserir mais as autoridades governamentais no processo de construção de uma escola forte, participativa e que dialogue com a comunidade. Também o tempo de cada jovem quanto a identificação da necessidade de transformação individual é diferente, principalmente porque estes jovens vivenciam uma fase da vida permeada por incertezas e lidam diariamente com tantas desigualdades sociais que influenciam diretamente a sua forma de atuação nos espaços, mas é entendido pelo Grupo AdoleScER que esse processo está iniciado, está ocorrendo, em tempos diferentes, mas mostrando que a escola pode ser um espaço que, para além da construção de conhecimento, incentiva a socialização, a comunicação não violenta e os sonhos da juventude, mostrando que eles podem ser o que quiserem ser.
[1] Estratégia usada na Metodologia do Tratamento Comunitário para gerar vínculos entre as instituições (ong e escola) de maneira a perceber a dinâmica escolar e identificar os principais problemas e potencialidades do local.